A GAROTA ERA A CARA DA BISAVÓ
LEITURA ECONÔMICA DA REPÚBLICA
OLÁ GALERA.
Nas aulas de História, você viu que investigamos os primeiros 100 anos da República no Brasil do ponto de vista histórico. Nesse texto, pensaremos no impacto dessas concepções do ponto de vista da ocupação geográfica e econômica do país.
Como Geografia Econômica não é uma abordagem muito fácil, utilizaremos uma "parábola". Ou seja, utilizaremos uma linguagem alegórica para propor uma reflexão sobre a ocupação do espaço geográfico direcionada pelas opções político-econômicas feitas pelas elites ao longo da História.
A GAROTA ERA A CARA DA BISAVÓ
O texto que você lerá é uma parábola, criada com fins didáticos, para explicar a reflexão feita pelo economista Celso Furtado que explica o processo de ocupação do território e as estruturas econômicas e sociais promovidos no território nacional nesses primeiros 100 anos de nossa história.
1° MODELO = ECONOMIA PRIMÁRIA E EXPORTADORA
Durante quatro séculos e pouco, a economia brasileira viveu de exportar produtos de plantação, de mina, tirados da mata. Exportar quer dizer, vender para fora do país. O contrário é importar, que é, o país comprar de fora. Aqueles produtos que o Brasil exportava (e muitos que exportava) levam pouca técnica. Eles são vendidos quase como a natureza os dá, sem muita transformação pela mão humana. Estes produtos se chamam primários.
Havia uma razão histórica para fazer assim... O Brasil, de início, não foi pensado para ser uma nova nação. Os primeiros portugueses vieram para garantir a Bahia e o Rio para o Rei. Estas baias eram importantes para passagem das caravelas, dando uma volta enorme, para irem para a Índia. Mas, para garantir a terra, tinha que ter aqui, gente fiel ao rei. E esta gente ia produzir o que? Então, decidiram, plantar cana para vender o açúcar na Europa.
Havia também uma razão econômica... Desde o começo e até o Brasil começar a se industrializar, dava mais lucro plantar café, vender o café, comprar ternos feitos na Inglaterra, do que fazer ternos aqui. Daí a gente não produzir as roupas aqui e comprar as roupas inglesas seria mais barato, e então continuava a ser mais negócio plantar açúcar, café, etc.
Havia também uma razão política, sobretudo no fim do tempo da colônia e depois da Independência. Tinha havido movimentos revolucionários com forte base popular. E então, para se defender do povão (da ralé, como diziam) a elite brasileira tinha interesse que os ingleses se interessassem em evitar uma revolução social no Brasil.
A Inglaterra era a maior potência econômica, mas também militar (sobretudo naval) daquela época. Se houvesse uma revolução no Brasil, os Ingleses iam intervir. Por que? Porque se a economia se voltasse mais para as necessidades do povo, o Brasil ia comprar menos artigos ingleses, porque quem comprava artigo Inglês eram os ricos.
E assim, nos primeiros anos de República (1889-1930), o Brasil se constituiu como uma ECONOMIA AGROEXPORTADORA. Como resultado dessa opção, a população vivia no campo (zona rural), a força de trabalho era composta, majoritariamente por imigrantes europeus e asiáticos (imigração de massa do final do século XIX e início do XX) e as instituições de Estado estavam à serviço das oligarquias agrárias (proprietários de terra).
2° MODELO = SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES
Com o tempo isso mudou por que as guerras e as crises internacionais forçaram o Brasil a se voltar para dentro. Então, o Brasil começou a produzir os produtos que antes eram importados (comprados do estrangeiro). E aí começa a funcionar o segundo modelo que começa em 1930, se chama, “substituição de importações”.
A indústria nacional começa a produzir o que antes era importado. Para isto, ela acaba tendo de comprar no Exterior equipamentos e materiais.
O governo começa, também, a fixar salários. As massas que a agricultura não consegue ocupar vão para a cidade e aceitam de trabalhar por salários baixos, (os salários baixos da indústria ainda são mais altos que os da lavoura). Isto tudo traria grandes pulos e desequilíbrios e então o governo tem que marcar e dirigir as coisas.
A indústria que surge no Brasil corresponde ao mercado já existente. Ela vem substituir importações. Mas este mercado era a radiografia em dinheiro, de uma sociedade muito desigual. Há classes e grupos que tem quase tudo. Há uns poucos no meio, esperneando para subir, com medo de cair. E há muito povo em baixo, que não conta para a economia, para o mercado, porque não tem com que comprar.
O Brasil industrial começa então a se formar à imagem e semelhança do Brasil tradicional. Como há muita mão de obra chegando nas cidades neste tempo (1930-1960) e sem organização, os salários são relativamente baixos para os trabalhadores. Como o Brasil estava despreparado em matéria de técnicos “estudados”, vai haver sempre engenheiros de menos, médicos de menos e estes vão ter altos salários. O que acaba provocando desigualdade, a marginalidade urbana e inflação.
No entanto, a situação dos trabalhadores urbanos era melhor do que a vivida no campo porque a manutenção das elites no poder exigia concessões o que deu origem aos sindicatos, a formalização do trabalho (carteira de trabalho), salário mínimo e previdência social. Isso impulsionou o ÊXODO RURAL e o CRESCIMENTO URBANO. Por outro lado, uma nova classe social da elite, a BURGUESIA INDUSTRIAL, foi se formando e se fortalecendo, gradativamente, o que mudou o perfil do poder econômico nos grandes centros urbanos do país.
3º MODELO = O MILAGRE BRASILEIRO
Por volta de 1960, o impulso que a economia brasileira vinha recebendo, de substituir importações, estava acabando. A taxa de lucro começou a cair. Então, os industriais decidiram parar de expandir suas indústrias. Mas acontece que há indústrias que escolhem quando as outras param de expandir. Com isto, as indústrias que antes compravam sozinhas e em larga escala e produziam um milhão, agora produzem juntas, o mesmo milhão. Quer dizer, se vier mais uma fábrica, ela só diminui o lucro das outras. Aquela que recebia menos encomenda, comprava menos ainda de terceiros e desempregava gente. A gente desempregada, deixava de comprar coisas. Enfim, faltava um impulso, para a economia retomar movimento.
É que na economia capitalista para haver crescimento rápido há inflação, e os preços começam a subir. Quando o governo consegue parar os preços, a economia não cresce tão depressa. Então o governo começou a manobrar o câmbio e os salários, de acordo com os interesses das elites econômicas, o que gerou o crescimento dos negócios sem aumento dos custos da produção (arrocho salarial). Foi o Milagre Econômico!
O milagre foi que, de 1968 a1973, o valor total das coisas produzidas no Brasil cresceu muito depressa e os preços estavam subindo, mas foram subindo mais devagar.
Os santos que fizeram o milagre foram os trabalhadores brasileiros, mais ou menos 75% da população, mas especialmente a turma do salário mínimo. O pessoal abaixo do salário, não tinha mesmo mais muito onde apertar. O pessoal mais qualificado, foi sacrificado, mas menos. O que o povo chama de arrocho salarial, em linguagem técnica se chama contenção.
Quando Delfim Neto era professor na USP, antes de ser ministro, dirigiu um estudo sobre as causas da inflação no Brasil e concluiu que o salário do trabalhador pesava pouco na inflação. Mas, quando se tornou ministro, disse que o arrocho era preciso para segurar a inflação. Ele dizia que o bolo precisava primeiro crescer para somente depois ser dividido.
Delfim dizia que, para animar as empresas a se expandirem, a taxa de lucro tinha que subir, para as empresas terem mais dinheiro para usar na expansão. Outra razão é que o Brasil precisava de exportar, vender nossos produtos lá fora. Para isto, tinha que baratear as coisas que a gente faz. Sem sacrificar o lucro, que é sagrado, o jeito era pagar menos o operário e o governo perdoar parte do imposto.
DE PAÍS POBRE À PAÍS "DESIGUALMENTE" DESENVOLVIDO
Agora, voltamos ao Brasil. O que mais faz crescer o valor do produto são aquelas coisas que a gente fina compra, porque a renda está concentrada. Então, para “crescer-rápido”, o Brasil tem que produzir muito carro e não interessa se falta feijão.
O carro (antes de 1989, era um artigo de luxo!) usa muito capital, usa máquina, muita engenharia e relativamente pouca mão-de-obra. (Para produzir 40 mil cruzeiros de feijão, de sapato ou de casa para o povo, se precisa de mais mão de obra do que para se fazer um carro que custa os 40.000). A renda que o carro produz, vai para o capital e as máquinas (lucro da empresa, juros do banco); vai para a engenharia (salário do engenheiro) e pouco para mão de obra. Resultado: a renda se concentra.
E então de novo, para atender esta sociedade com renda concentrada em cima, a economia brasileira tem que produzir cada vez mais carros, TV a cores, etc. O bolo nunca se reparte, porque se ele se repartir, este mecanismo do crescimento rápido, pifa.
O governo se encarrega dos abacaxis (quem quer comprar a rede suburbana da central?) ou aquelas empresas que engolem quantidades monumentais de recursos e não podem operar com lucro (o governo é assim, o bagageiro da economia). Ou empresas que, pelo tamanho não cabem nas costas do empresário nacional, mas que não vale a pena (por segurança nacional) estarem nas mãos de estrangeiros (como petróleo, por exemplo).
A concentração de renda não serviu e continua não servindo, sobretudo, à formação de capacidade produtiva. Ela serve mais para concentração de consumo da elite. Aquelas indústrias que produzem bens para o consumo da elite, pelo menos até 1973, estavam, crescendo mais depressa que as indústrias de máquinas, equipamentos, etc.
O TÍTULO DE ELEITOR DA GAROTA
Durante a primeira fase do crescimento industrial brasileiro, se podia ter certa democracia. O homem do campo não tinha muita ideia do que estava acontecendo e era fiel ao “coronel”. Ao operário, se podia mesmo “dar” vantagens (o que tinha a vantagem de ele não lutar por elas).
O momento em que o homem do campo começou a acordar (e organizar-se em sindicatos e ligas), coincidiu com a passagem do segundo modelo para o terceiro, em que “tinha” que haver arrocho salarial e tudo o mais.
Então, é claro, não dava mais condição para as empresas multinacionais e sua aliada, a elite brasileira, deixarem haver democracia, eleições livres, liberdade de reunião, de expressão e tudo o mais. No que ficou moça, a garota ficou ainda mais “a cara da bisavó”.
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ATIVIDADE 5: A GAROTA ERA A CARA DA BISAVÓ
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