OLÁ GALERA,
Chegamos à última atividade desse
ciclo que tratou dos primeiros 100 anos de República brasileira, que concluímos
com o estudo da Ditadura Militar. Mas, a pergunta que fica é: Como terminou a
ditadura e se deu a transição para chamada “Nova República”?
Desde o final de 1975, o grupo de
Geisel havia compreendido que o retorno à democracia seria inevitável. Começa então um processo de abertura que
ficou conhecido como a “distensão: lenta, gradual e restrita”.
Na verdade, a ditadura já não
conseguia se manter sem cair em um mar sem fim de contradições e problemas. Na
arte, o compositor carioca Chico Buarque parecia “profetizar” o
fim da ditadura com a música “apesar de Você”:
“Hoje você é quem manda, falou, tá
falado; não tem discussão; Não. A minha gente hoje anda falando de lado e
olhando pro chão, viu! Você que inventou esse Estado e inventou de inventar
toda a escuridão; você que inventou o pecado, esqueceu-se de inventar o perdão.
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia. (...) Você vai ter que ver a manhã
renascer e esbanjar poesia. Como vai se explicar vendo o céu clarear. De repente,
impunemente. Como vai abafar nosso coro a cantar na sua frente? Apesar de você,
amanhã há de ser outro dia!”
Veja (abaixo) o clip da música com imagens
de época:
As promessas de distensão, o reconhecimento das eleições, e o fim
da censura prévia a jornais, convivendo com caça violenta aos comunistas e afins,
pode parecer um sinal de contradição do regime. Na verdade, revelam a
estratégia da distensão, ao menos até meados de 1977. Abrir espaços
institucionais e canais de diálogo com vozes seletivas e autorizadas, sem
necessariamente abrandar a repressão à esquerda e aos movimentos sociais como
um todo. Essa era a regra.
Assista o 3º documentário da série sobre a ditadura produzido pelo
acervo Vladimir Herzog:
A REABERTURA POLÍTICA - 1979 à 1985
O general Figueiredo tomou posse, anunciando o propósito de “fazer deste país uma democracia”. A “abertura”, seu projeto de governo, significava reduzir aos poucos os aspectos mais autoritários da ditadura, institucionalizar o regime, mas sem ceder o poder à oposição, nem absorver suas propostas democratizantes. Ele controlou a situação, aproveitando as divergências que iam surgindo dentro da oposição.
Assim mesmo a oposição cresceu, as greves operárias no ABC paulista se espalharam para outras cidades e categorias de trabalhadores, o movimento pela anistia ganhou corpo e foi às ruas. O Comitê Brasileiro pela Anistia formou núcleos em diversos estados e realizou manifestações expressivas. Em diversos países da Europa e da América, os exilados receberam apoio dos movimentos democráticos e formaram dezenove comitês. Queriam uma anistia ampla, geral e irrestrita.
Figueiredo começou rejeitando a proposta de anistia, pois queria apenas a revisão de algumas penas. Mas havia resistência no Congresso e suas propostas limitadas não avançavam. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se pronunciou pela anistia. Alguns presos políticos fizeram greve de fome em apoio à anistia. A “linha dura” militar, encastelada em seu sistema de informações e repressão, se opôs fervorosamente à ideia.
Anistia restrita e recíproca
O governo enviou ao Congresso um projeto de anistia restrita. A oposição apresentou um substitutivo de anistia ampla. Em 21 de agosto de 1979, com as galerias do Congresso lotadas, vaiando pesadamente os políticos governistas, os debates se alongaram por horas. O projeto governamental foi aprovado por votação simbólica, depois que a emenda de Djalma Marinho, que ampliava a anistia do governo, tinha sido rejeitada por 206 a 201 votos.
A luta pela anistia foi longa. A lei de 1979 não foi bem vista pelos militantes e familiares que exigiam uma anistia “ampla, geral e irrestrita”. Já em 1968, algumas vozes, até moderadas, falavam em anistia, mas naquele momento a esquerda tinha outra agenda, a luta armada. Depois da derrota das guerrilhas, o tema da anistia começou a tomar corpo entre os exilados brasileiros.
Mas essa luta entrou para a agenda política efetivamente após 1975, com a criação do Movimento Feminino Pela Anistia (MFPA), liderado por Therezinha Zerbini. Em 1978, surgiu o Comitê Brasileiro de Anistia (CBA), apontando para outro sentido da palavra. Enquanto o MFPA defendia a anistia como “reconciliação da família brasileira”, os CBAs, mais ligados à militância de esquerda, defendiam essa medida como primeiro passo para a justiça e para a investigação das violações aos direitos humanos cometidas pelo regime em nome do combate à subversão.
Nos anos de 1978 e 1979, ocorreram vários comícios e manifestações públicas a favor da anistia. O tema foi incorporado pelo regime, mas apropriado de maneira diferente das demandas do movimento. No final, a anistia legal foi parcial e restrita, e ainda por cima beneficiou os torturadores, através do perdão aos “crimes conexos” praticados para combater os “subversivos”.
Ainda que limitada, a anistia permitiu que milhares de pessoas perseguidas ou com seus direitos políticos cassados recuperassem sua cidadania. Imediatamente milhares de exilados começaram a voltar. Dos 200 presos políticos, 19 tiveram libertação instantânea. Os outros foram sendo libertados nos meses seguintes. A Justiça Militar elaborou uma lista oficial de 374 anistiados, entre eles o histórico líder comunista, Luís Carlos Prestes, o líder trabalhista, Leonel Brizola, e o ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes.
Tendo sido imposta a um Congresso mutilado e atemorizado sob o peso das leis draconianas da ditadura, decadente mas ainda presente, a anistia foi cada vez mais considerada insuficiente pela sociedade, por ser recíproca, isto é, estabelecer que também os crimes cometidos pelos agentes do Estado nas ações de repressão fossem anistiados.
Passados mais de trinta anos do fim da ditadura, esse continua a ser um dos problemas políticos mais graves e um entrave ao processo de plena democratização do país. Até porque, encorajados pela impunidade dos torturadores do passado, na atualidade os agentes policiais continuam praticando a tortura de maneira generalizada em todo o país.
Reorganização partidária
Percebendo que o bipartidarismo imposto em 1966 não atendia mais a seus interesses, já que a cada eleição a oposição avançava, o governo de Figueiredo enviou um projeto de reforma partidária ao Congresso. Ela foi aprovada em novembro de 1979, contra o voto do MDB. A intenção era dividir a oposição e ampliar a base de apoio do governo, conforme denunciavam os emedebistas.
Arena e MDB foram extintos e surgiram seis novos partidos. De fato, a oposição ficou dividida.
O Partido Democrático Social (PDS) foi o herdeiro da Arena, portanto, passou a ser o novo partido de apoio ao governo. Já o MDB deu origem ao PMDB, sem os chamados “moderados”, que foram compor o Partido Progressista (PP), com setores minoritários da Arena. O PP se dizia independente, mas seria um partido de apoio disfarçado ao regime.
O governo dificultou a Leonel Brizola a posse da sigla do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), sua antiga legenda. Brizola fundou o Partido Democrático Trabalhista (PDT), procurando aglutinar as bases tradicionais trabalhistas e getulistas. Ainda banidos, o PCB e o PC do B se acomodaram dentro do PMDB.
Havia a proposta de criação de um partido de trabalhadores, tendo como base os operários do ABC, as comunidades eclesiais de base da Igreja católica, e organizações de esquerda de cunho trotskista, classista e desligadas da tradição da esquerda existente anteriormente. Essa articulação se concretizou na formação do Partido dos Trabalhadores (PT), no início de 1980. Essa foi a mais importante novidade do novo cenário político, conforme o futuro confirmaria.
As greves operárias contestam a ditadura
A inflação chegava a 78% ao ano. Os metalúrgicos do ABC organizaram grandes greves, de 1978 a 1980, sustentadas por assembleias com até 80 mil operários reunidos no Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo. Essas greves confrontaram o poder e foram alvo de grande repressão.
A de 1980 se estendeu por mais 16 cidades do interior de São Paulo. O sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo foi alvo de intervenção, e 16 líderes da greve foram presos, inclusive o presidente do sindicato, Luis Inácio da Silva.
A greve terminou no dia 11 de abril, após 41 dias de paralisação em meio a novas prisões e a uma maciça intervenção da polícia militar. Embora vencida, a greve contribuiu para comprometer o projeto de manutenção do poder da ditadura. A mais completa cobertura jornalística dessa greve está no jornal Movimento.
Recessão e divergências: terrorismo de direita
Em 1982, a taxa de inflação foi a 99% ao ano, a economia entrou em recessão, a produção da indústria automobilística caiu 30%, milhares de trabalhadores foram demitidos. A dívida externa explodiu e os investimentos externos fugiram do país.
Setores militares que se opunham à política de abertura manifestaram seu inconformismo, promovendo uma escalada de ações terroristas. Jogaram bombas, fizeram sequestros, incendiaram bancas que vendiam jornais da imprensa alternativa. Uma carta-bomba enviada ao escritório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio Janeiro provocou a morte de uma funcionária, Lyda Monteiro, em agosto de 1980.
Alguns meses depois, na noite de 30 de abril de 1981, duas bombas explodiram no Centro de Convenções Riocentro, no Rio de Janeiro, onde se realizava um evento de comemoração do 1º de maio, com a presença de cerca de 20 mil pessoas. Uma das bombas explodiu dentro de um automóvel ocupado por um capitão e um sargento do Exército. O segundo morreu no local e o primeiro ficou gravemente ferido. A segunda atingiu a casa de força do edifício.
Diante da evidência de que o ato terrorista havia sido cometido por militares, criou-se uma crise política. O governo prometeu esclarecimentos e um inquérito foi aberto pelo Exército. Mas o relatório final informou que os dois militares estavam a trabalho no local de uma festa de comunistas e foram vitimas de um atentado provocado por um grupo não identificado. O sargento foi sepultado com honras de herói militar.
Na época houve forte contestação até mesmo no Superior Tribunal Militar (STM), mas o inquérito acabou arquivado. Embora o general Figueiredo tenha manifestado sua indignação com o acontecimento, documentos sigilosos do STM só divulgados em tempos recentes indicam que ele e outros altos oficiais sabiam previamente do atentado.
As eleições de 1982: vitória da oposição
O governo legislou abundantemente, buscando enfraquecer e dividir a oposição: restabeleceu o voto direto para governador, mas proibiu coligações, obrigou o voto vinculado (só em candidatos da mesma legenda) e o lançamento de chapas completas ao Executivo e ao Legislativo. Para completar, fez ser aprovada a Emenda Constitucional que ampliou o número de deputados federais dos estados menos populosos onde seu partido, o PDS, era mais forte.
Mesmo assim, não conseguiu impedir o clima plebiscitário que a eleição assumiu entre PDS e PMDB. Este chegou ao governo em nove estados, inclusive os dois de maior eleitorado, São Paulo, com Franco Montoro, e Minas Gerais, com Tancredo Neves. No Rio de Janeiro, venceu Leonel Brizola, do PDT, alvo da ojeriza do sistema militar, o que causou até ameaça de golpe. A oposição passou a governar a maior parte da população do país.
Diretas já!
Os governadores eleitos se defrontaram com recessão, inflação alta, dívida externa impagável, desemprego, greves de funcionários públicos e de operários. Não conseguiram atender às necessidades da população.
No plano político, surgiu a bandeira de eleições diretas para presidente em 1984. Um programa liderado pelo senador Teotônio Vilela defendeu eleições diretas, assembleia constituinte, moratória da dívida externa, conversão da dívida interna em “bônus de guerra”.
Em junho de 1983, Ulysses Guimarães, líder do PMDB, se surpreendeu com o apoio a um ato em favor das diretas em Goiânia, quando dez mil pessoas foram às ruas. Criou-se uma frente dos partidos de oposição pelas eleições diretas.
Em 27 de novembro de 1983, um comício convocado pelo PT em frente ao estádio do Pacaembu reuniu 15 mil pessoas. No dia seguinte, dez governadores assinaram um manifesto propondo as diretas. Foi criado o slogan “Diretas já! Eu quero votar para presidente”, e a cor amarela foi adotada como símbolo. A campanha envolveu todos os grupos de oposição, e contou até com dissidências do regime, angariando amplo apoio na sociedade civil, independente de filiações ideológicas mais à esquerda ou mais à direita.
Em 12 de janeiro de 1984, um comício em Curitiba reuniu 60 mil pessoas. No dia seguinte, em Porto Alegre, 10 participaram de uma passeata. No outro dia, num comício em Camboriú, em Santa Catarina, estiveram presentes 15 mil veranistas. No dia 25 daquele mês, aniversário de São Paulo, um comício na Praça da Sé reuniu uma multidão estimada em 250 mil pessoas. A Caravana das Diretas percorreu todas as capitais com grande agenda de comícios. A adesão popular superou de longe as expectativas. O objetivo era aprovar a emenda apresentada pelo deputado Dante de Oliveira (PMDB-MT).
A campanha crescia a cada dia. Em 10 de abril de 1984, um comício na Candelária, no Rio de Janeiro, atraiu uma multidão de 1,2 milhões de pessoas. Em 16 de abril, no Anhangabaú, estima-se em 1,5 milhões o número de participantes. São as maiores manifestações de massas da história do país, até hoje não superadas. Em 18 de abril, Brasília amanhece tomada por tropas do Exército, pois tinha sido decretado estado de emergência na capital.
Em 25 de abril, o Congresso votou a emenda constitucional das diretas, que conseguiu o apoio da maioria, com 298 votos, mas ainda faltaram 22 para alcançar dois terços do total, o quórum necessário para aprovar uma emenda à Constituição. Uma grande frustração tomou conta do país. Mas ouviu-se por toda parte o grito: “a luta continua!”.
Para as eleições indiretas, a oposição lançou a candidatura de Tancredo Neves, apoiado pelos dez governadores oposicionistas. Na convenção do PDS saiu vitorioso Paulo Maluf, o ex-governador indireto de São Paulo, o que causou tremenda insatisfação e um grande racha no partido. Parte dos delegados se bandeou para a candidatura de Tancredo, inclusive José Sarney, que viria a ser seu vice.
A campanha transcorreu em clima de tensão, com grande irritação dos militares, e ameaças de golpe que não se concretizaram. Até que, em novembro, os chefes militares concordaram que a sucessão se fizesse “de acordo com a lei”.
Na votação do Colégio Eleitoral, constituído pelo Congresso Nacional, Tancredo Neves derrotou Maluf com folga, por 480 votos a 180. No discurso da vitória, anunciou a Nova República, comprometendo-se a convocar a Assembleia Constituinte. Mas Tancredo não chegou a tomar posse, pois adoeceu antes da cerimônia, vindo a falecer em abril, depois de uma longa agonia que comoveu a população brasileira.
Em 15 de março de 1985, ele não compareceu à cerimônia de posse. Quem assumiu a presidência foi o ex-governista José Sarney, seu vice. Revoltado com Sarney, a quem considerava um traidor, o general Figueiredo não lhe passou a faixa presidencial, saindo pela porta dos fundos do Palácio do Planalto. Esse foi o momento final da ditadura militar no Brasil.
Fonte: http://memoriasdaditadura.org.br/periodos-da-ditadura/
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