Olá Galera. Eu, o @HG, e o seu Professor de História (Celso Barreiro) preparamos uma aula sobre o método científico da História. O método é uma "ferramenta" de trabalho. Com ele, o historiador investiga as fontes históricas, e constrói uma síntese crítica identificando as semelhanças e diferenças e observando as transformações e permanências que ocorreram ao longo do tempo.
CLIO: A MUSA DA HISTÓRIA
A imagem (acima) é uma alegoria da musa Clio, que simbolizava a História na Grécia antiga. Para os gregos, o canto das musas, atributo da palavra, daria origem ao mundo e ao homem. Não por acaso, essa deusa grega é representada com um livro em uma das mãos (o passado), os pés no chão (o presente) e os olhos voltados para o horizonte (o futuro). Na mão esquerda, uma trombeta (a palavra) designa o ofício do Historiador “dizer o que sabe, anunciar a verdade ainda que seja o infortúnio”.
Ora, o historiador é um cientista social e precisa de se situar no tempo e no espaço em que vive para entender sua própria vida e a realidade em que está inserido. Para que possa fazer o seu trabalho ele precisa de um MÉTODO (um caminho, uma maneira de agir) que permita a observação das transformações e permanências ocorridas ao longo do tempo.
O método é a ferramenta de trabalho do historiador. Munido dessa ferramenta (o método) ele investiga, seleciona, lê e interpreta as Fontes Históricas e constrói uma síntese explicativa da realidade que foi objeto de sua pesquisa.
A história é, como disciplina escolar, um processo de aprendizagem que pretende desenvolver um conjunto de saberes e habilidades que permitam aos alunos e alunas um olhar crítico, uma postura frente aos fatos do cotidiano. Enfim, Atitudes Historiadoras. A história amplia o olhar do ser humano diante da realidade e permite pensar e agir de forma crítica e contextualizada.
O ponto de partida do trabalho do historiador são as fontes históricas. O historiador precisa reconhecer e interpretar essas fontes. Mas, antes disso, é preciso distinguir os diferentes tipos de fonte histórica. Há diferentes tipos de fonte: Documentos Escritos, Registros Visuais, Testemunhos Orais, Monumentos, Vestígios Arqueológicos, Fontes de Cultura Material, Patrimônio Imaterial, etc.
O historiador analisa as fontes com o objetivo de identificar diferenças e semelhanças e observar as transformações e permanências ocorridas no tempo. Para entendermos melhor essa questão, recomendamos que você veja o 2º programa da série EducAção. (A teleaula é a primeira da série e começa logo após o poema de Ferreira Gullar)
Viu só como o programa da TV Câmara revisita nossas aulas anteriores? Outro dia fiquei pensando muito sobre as transformações e permanências que acontecem todos os dias na vida da gente que nem a gente viu no filme da Dona Cristina.
Lá na Escola Luiz Jacob, por exemplo, tem uma garota que veio do Haiti, e um menino que chegou da Venezuela que mora com a avó, e tem também um boliviano que a mãe trabalha numa oficina de costura. Fiquei pensando: Não deve ser fácil viver mudando!
Minha avó me contou que há muitos anos atrás, quando Rio Preto foi colonizado, muitos imigrantes vieram para cá... da Itália, do Líbano, da Espanha. Era a chamada “imigração de massa” que trouxe milhares de pessoas da Europa para o interior de São Paulo da segunda metade do século XIX ao início do século XX.
Ela me contou que quando ela veio do Nordeste, nos anos de 1960, a vida estava muito difícil lá no sertão. Ela me disse que, por aqui, no Estado de São Paulo, o povo que vinha do Nordeste era chamado de “baiano”. Já os meus primos cariocas disseram que lá, no Rio de Janeiro, o povo chama os nordestinos de “Paraíbas”.
Essas mudanças aconteceram por que nessa época as cidades brasileiras estavam crescendo rapidamente, o que atraiu milhões de migrantes do norte e do nordeste do país para trabalhar nas fábricas e fazendas do sudeste.
E isso continua acontecendo, o povo continua mudando muito de casa... por que a situação continua difícil! É por isso que tem gente vindo da Venezuela e do Haiti lá pra escola. E é muito bom conhecer outras línguas, outras brincadeiras e outros costumes diferentes dos nossos!
A verdade é que vivemos num mundo marcado por muitas mudanças e transformações. E não somente por causa dos haitianos, venezuelanos e bolivianos, de hoje, ou dos “baianos” ou “paraíbas” do tempo de minha avó, ou dos italianos e libaneses da época da grande imigração de massa para as Américas. Como na música do Lulu Santos: “Tudo muda o tempo todo no mundo/ num indo e vindo infinito...”
Mas, apesar das aparências, nem tudo muda... algumas coisas permanecem, como nas memórias de “Dona Cristina” de que falamos em outra ocasião. Ou seja, a história é feita de transformações e permanências, de mudanças mas também de continuidades. E cabe ao historiador recuperar essas memórias das “transformações e permanências” da nossa vida.
O @HG tem uma boa memória, uma memória “virtual”, dessas que somente os robôs e computadores possuem. E, diferente da memória de Dona Cristina, sua memória de robô não falha! (na verdade falha “às vezes”, mas eu evito espalhar para que não me desliguem ou troquem por um outro robô que tenha uma memória maior!)
Mas os humanos não podem trocar de memória, ou serem descartados por outros de memória melhor. Daí surge a História para reativar e retroalimentar a memória dessas experiências. Esse é o ofício do historiador: ativar as memórias vividas ao longo do tempo fazendo as perguntas necessárias às testemunhas, aos objetos da cultura material e aos documentos escritos deixados pelo ser humano.
Lembra do filme da Dona Cristina? Não teve um momento lá pelo final que ela deu para Antônio um bocado de coisas para ele guardar? Vamos lembrar do episódio:
“DONA CRISTINA: - Tá vendo esta concha? Eu achei na primeira vez que fui pra praia. Quando eu era pequena nós íamos pra praia de carroça. Levávamos dois dias. Minha mãe fazia fornadas de bolachas. Botava numas latas grandes. A gente enchia a carroça de cobertas, comida e saíamos atravessando as fazendas até chegar na praia. (pega uma nota de dinheiro antiga do sutiã) Este dinheiro o meu padrinho me deu uma vez que foi nos visitar, ele morava em Caxias e só aparecia uma vez por ano. Eu achei melhor não gastar e guardar como uma lembrança dele. (pega o Santo Antônio) este é o santo Antônio, o santo casamenteiro. (pega a foto) olha eu quando era pequenina na confeitaria do meu pai. O meu pai tinha uma confeitaria ali na rua da Praia. (pega o pregador) Este pregador o meu marido me deu numa páscoa. Quando eu cheguei em casa tava um ovo em cima da minha penteadeira. Eu me desanimei. Não é possível que ele tenha me dado um ovo de chocolate eu pensei, ele sabia que eu ficava até aqui de chocolate por causa da confeitaria Mas aí eu sacodi o ovo e vi que tinha alguma coisa dentro. (pega um monóculo e mostra pra Antônio) Olha (Antônio bota o monóculo contra o céu). Este é o Francisco, meu filho e este era um dos aviõezinhos dele (tirando um aviãozinho do bolso). Eu dei pra ele quando ele fez cinco anos. Acho que foi aqui que ele começou a querer ser aviador.”
Observe que cada um dos objetos de “Dona Cristina” contém uma memória, guarda uma lembrança de outros tempos e épocas. Nossa História também funciona assim... mas como na História de Dona Cristina, essas lembranças estão todas misturadas, perdidas no meio dos objetos, documentos e testemunhos de épocas passadas.
Daí o papel do historiador é fazer as perguntas certas para trazer as memórias que os objetos e documentos “escondem”, e “podem contar”, mas que estão misturadas em nosso dia-a-dia. O papel do historiador, e que a nossa atitude historiadora pode ajudar a fazer é interpretar essas fontes, sejam os testemunhos das pessoas (fontes orais), os objetos do passado (fontes da cultura material), os documentos (fontes escritas) ou os restos, ruínas e fósseis (vestígios arqueológicos).
O historiador analisa essas fontes e constrói uma síntese, uma explicação significativa para os acontecimentos, que ajudam a gente a entender as mudanças e continuidades que dão sentido à nossa vida. Para entender melhor, vamos analisar o documentário “Liberdade” que conta a história de pessoas que se mudaram da África para o Brasil e que foram morar na liberdade, um bairro da capital paulista.
O documentário começa com uma cena que se passa numa rua do bairro da liberdade, no centro de São Paulo. Na frente da câmera uma japonesa, depois um negro, depois outro negro e uma negra, e assim por diante... Enquanto a cena inicial se passa, um canto “em francês”, língua nativa dos guineenses (mas, com legenda em português pra gente entender, é claro!), diz:
“Liberdade! É a voz de um povo que chama todos os seus irmãos da grande África/ Liberdade! É a voz de um povo que chama todos os seus irmãos a se reencontrarem/ A Liberdade é o hino do meu país. Meu país é a Guiné. A Liberdade é um bairro no centro da cidade de São Paulo. Eu cheguei aqui há dois anos.
Quando as pessoas daqui falam da Liberdade, elas lembram dos imigrantes japoneses/ Eles vieram ao Brasil de navio e chegaram há 110 anos atrás. Eles se estabeleceram aqui porque os aluguéis eram baratos e haviam muitos cortiços e pensões também.
Eu moro na Liberdade, mais lá para baixo. Longe da praça da Liberdade/ A Liberdade é o lugar do estrangeiro em São Paulo. O estrangeiro que um dia foi japonês, chinês e coreano. Mas hoje somos nós, guineense, haitiano, congolês, angolano, togolês.”[2]
Qual é a interpretação histórica que podemos fazer do documentário? Por que ele alterna a cena entre a japonesa e os negros africanos? Por que a cena está situada nesse bairro? O que significam esses lugares? Que histórias, mudanças e permanências podemos identificar no documentário?
A liberdade, antigamente, era um bairro composto, em sua grande maioria por imigrantes japoneses. Esse bairro foi povoado na época da imigração japonesa, aquela “imigração de massa” de que falamos, no início do século XX. Os japoneses se instalaram ali por que havia vários cortiços, e casebres muito humildes, e os aluguéis eram baratos.
Ocorre que, muitos anos antes, naquele lugar havia uma forca onde eram assassinados os negros, capturados pelos capitães do mato e que haviam fugido das senzalas, condenados à pena de morte.
Os japoneses, contudo, não queriam morar no “Largo dos enforcados” e, muito menos serem identificados com os que viveram o suplício da escravidão, ainda que sua vida não fosse exatamente um “mar de rosas”, como sugeria o nome do bairro. Então, mudaram o nome do bairro para “Liberdade”.
Hoje, a liberdade já não recebe tantos imigrantes japoneses, mas é um lugar para onde vão muitos africanos da costa da Guiné, que é de onde vieram muitos dos negros na época da escravidão.
Ora, ao mostrar essa dinâmica marcada por migrações e mudanças, e pela convivência, aparentemente pacífica, entre essas diferentes realidades culturais, étnicas e populacionais, o filme evidencia como aquele lugar é palco das transformações e permanências.
E, também, como o bairro da “Liberdade”, na capital paulista é, como em muitas outras cidades e lugares do país, um celeiro de patrimônios materiais (os prédios, a praça, as casas antigas, as igrejas...) e imateriais (as festas, como o “Bono-Dori” japonês mostrado no filme) que o historiador pode utilizar como de partida para seu trabalho.
E então, galera? Deu pra se ligar no que está acontecendo em nossa vida com a chegada de nossos irmãos e irmãs de outros países e regiões? Então está na hora de você nos dar um feed-back (retorno) daquilo que você aprendeu com essa conversa.
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