OLÁ GALERA.
Darcy
Ribeiro (1922-1997) é antropólogo, e escreveu vários trabalhos sobre as culturas
indígenas brasileiras e a evolução humana na perspectiva teórica de Charles Darwin
(autor do livro “A origem das espécies”, 1859) . Era conhecido por seu bom
humor, evidente no texto a seguir:
RABOS & PÊLOS: UMA PARÓDIA DA EVOLUÇÃO HUMANA
“Os homens em sua evolução
foram ganhando coisas e perdendo coisas. Algumas perdas foram graves. Os
ganhos foram poucos. O olfato, por exemplo, foi uma perda essencial. Qualquer
bicho tem faro melhor que o nosso, se orienta por ele para procurar comida e
namorada. Andam até no escuro, guiados pelos cheiros.
Grave, também, foi a perda do
focinho e o encolhimento da boca, mas teve a vantagem de permitir que a gente
abandonasse o hábito de usar a boca antiga para carregar as coisas. Para isso,
começamos a usar as mãos, que também se aperfeiçoaram com o polegar, que
permite manipulações delicadas.
A perda do pelame foi lamentabilíssima.
Um cachorro ou um macaco, ao natural, quer dizer, nus, estão vestidos. Nós, nus,
provocamos escândalos. Isso porque nos faltam os pêlos, que é a vestimenta
natural dos seres. Sem eles, se tem que fabricar roupa e também tem que ficar
na moda, sobretudo as mulheres, o que fica muito caro.
A perda mais grave, a meu
juízo, foi a do belo rabão dos macacos. Trocamos o rabo pela bunda acolchoada
que temos. Mau negócio. Nada nos podia ser mais útil do que bons rabos. Com
eles, nos verteríamos em primatas desbundados. A única vantagem que trouxe foi
nos dar a possibilidade de usar cadeiras para sentar, mas não seria ruim sentar
no rabo enrodilhado no chão. Pense só na beleza que seria passear, pulando de
galho em galho, com a garantia que o rabo dá para se equilibrar. Melhor, ainda,
seria nas fábricas, nas escolas, em toda parte, os seres providos de rabos
teriam os pés e as mãos livres para fazer coisas.
A professora, por exemplo,
ficaria controlando a turma, pendurada pelo rabo no lustre. Em lugar de
carteiras, teríamos traves de parede a parede, onde o pessoal se dependuraria,
liberando as patas e as mãos para o trabalho. Dependurado nas traves, você
podia segurar o livro com a mão esquerda, pegar a caneta com a mão direita,
usar a pata esquerda para consultar o dicionário e, ainda, a pata direita para
coçar a orelha. Formidável, não é?
A perda mais radical foi a da
posição quadrúpede, que usamos durante muitos milhões de anos, para a posição
ereta. Como quadrúpedes, púnhamos as quatro patas no chão, o que dava muito
mais solidez. Sobre duas patas, ficamos sempre meio desequilibrados e, depois,
quando se perde uma, fica muito complicado viver e trabalhar. A conseqüência principal
da adoção da posição bípede foi a dor ciática que castiga demais os velhos. É
uma dor terrível no traseiro. Dizem que é a saudade da nossa posição
quadrúpede, porque, enquanto tínhamos quatro patas no chão, as vísceras se
dependuravam na espinha, postas em posição vertical. Levantando os braços, as
vértebras se comprimem umas nas outras, o que provoca aquela dor insuportável.
O ganho único foi a possibilidade de subir escadas. Você acha que valeu a pena?”
Fonte: RIBEIRO, Darcy; ZIRALDO. Noções de coisas. São Paulo: FTO, 1995. p. 48.
FORMULÁRIO DE QUESTÕES
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